Entre marido e mulher alguém meta a colher

Os dados do Conselho da Europa indicam que 12 a 15% das raparigas com mais de 16 anos passam por situações de abusos nas relações amorosas.
O estudo sobre violência física e psicológica em namoro heterossexual, desenvolvido pela Universidade do Minho, diz-nos que um em cada quatro jovens é vítima de violência no namoro, revelando que existe tanta violência no namoro entre jovens dos 15 aos 25 anos como no casamento.

Este estudo revela também que os e as jovens têm uma percepção errada da violência no namoro, chegando mesmo a tolerar a violência sexual, que não é percebida sequer como violência e muito menos como crime.

«Só fez aquilo porque estava descontrolado, perdeu a cabeça».

«O descontrolo é porque tem medo de a perder. Não é violência».

«A violência sexual no namoro não existe. Agora, relações sexuais forçadas já são outra coisa».

«Se eles namoram, não acho que seja violência sexual».

Das vítimas registadas neste estudo (cuja amostra é constituída por um total de 4730 jovens, dos quais 58% são raparigas e 42% são rapazes), 20% sofreram violência emocional (insultos, ameaças, pressão psicológica e coerção) e 14% agressão física; 30% admitiram ter agredido o parceiro, sendo 23% agressão física, 18% emocional e 3% física severa.

O estudo da UMAR, de que hoje a imprensa dá conta (e aqui), confirma e reforça este cenário preocupante.

Há muitos mitos a destruir e eles são muito semelhantes ao que se encontram nas relações de intimidade adulta: o ciúme é uma prova de amor, a violência tem tendência a terminar quando as pessoas se casam ou passam a viver juntas, uma bofetada ou um insulto não é violência, a violência no namoro não é uma situação comum nem séria, não existe violência sexual no namoro, quando se gosta de alguém deve-se fazer tudo o que ele/ela gosta, os rapazes nunca são vítimas, é melhor ter um/uma namorado/namorada violento/violenta do que não ter namorado/namorada, a violência no namoro é um problema privado.

Da famosa canção infantil do Sebastião que dá pancada na mulher aos ditados populares, tudo contribui para um imaginário desculpabilizador.

Tinha alguma curiosidade em conhecer o desdobramento destes dados segundo a pertença de género mas, infelizmente, não os encontrei. Gostava de saber se eles confirmam (ou infirmam) esse outro ditado popular (adaptado): de pequenina se traça a rotina.

2 comentários:

Rombo no Polvo disse...

...Cretinos! A não quererem deixar os namorados terem sexo violento à vontade! :))

"Kidding" mas debatendo seriamente...

É... + uma questão em que as respostas parecem não ser absolutamente taxativas:

Se um casal praticar sexo violento em que um é dominador e outro, dominado, como é que se faz a distinção destas situações em que os profissionais da área claramente relatam que as pessoas só não foram ensinadas à possibilidade de uma vida melhor, copiam maus exemplos, etc.

Mas e daí, um casal com uma práctica que parece só uma opção mutuamente consentida, tb não pode na verdade ser o resultado desequilibrado dessa falta de exemplos positivos também, tal como estes de que fala o estudo?... ou estaríamos nós a ser pré-conceituosos?...

Lembro-me de um tipo que foi condenado por ter comido a namorada até à morte, apesar das provas inequívocas em como ela consentiu...

Eu só me lembro de um paralelo credível de solução: avaliação psicológica de casos que fujam à norma maioritária, como acontece para quem quer mudar de sexo. Não é suposto privar-se a pessoa de mudar de sexo, apenas têm de se certificar de que é aquilo que está mal na pessoa e não outra razão camuflada naquilo, como parecem ser a maioria.

E como as variantes das minorias face às maiorias são infindáveis, pessoalmente defendo avaliadores médicos (do tronco e da cabeça) para muitas situações de vida, como quando vamos para a natação e é preciso um atestado e uma prova em como, pelo menos, não nos afogamos.

Parece absurdo?...

Andrea Peniche disse...

Cara Rombo no Polvo,

O estudo fala em violência sexual e não em sexo violento ou sadomasoquismo, que são coisas diferentes.
A única bitola que aceito, como também referes, é a do consentimento informado.
O que me preocupa verdadeiramente é que as pessoas não sejam capazes de reconhecer a violência sobre si próprias, isto é, que não consigam discernir entre aquilo que querem e consentem e aquilo que as violenta.
Quanto à entrada da medicina nestes terrenos, tenho muitas dúvidas, mesmo muitas. Estive há dias no encontro das Panteras Rosa e ouvi-os a falar da experiência de um movimento trans em Barcelona que precisamente recusa a patologização. Nunca tinha pensado no assunto dessa forma e achei muito interessante. Podes procurar mais informação em http://panterasrosa.blogspot.com/

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