blasfémia

A 17 de Fevereiro de 1600, Giordano Bruno ardia nas fogueiras da Inquisição. A sua teoria sobre o universo infinito e a multiplicidade de sistemas siderais, entre outras coisas, foram suficientes para que adquirisse o estatuto de herege. Numa época em que a Igreja tinha uma doutrina oficial sobre Astronomia, a defesa intransigente das suas ideias conduziram-no à fogueira. Reza a história que, por não ter abjurado, a sua língua foi cravada com pregos e uma tábua para que parasse de blasfemar.

Quatro séculos depois, o «crime» de blasfémia ainda persiste na sociedade portuguesa, mesmo que as fogueiras, tábuas e pregos tenham sido banidos.

Diz hoje a imprensa que a Rede Ex-Aequo viu recusada, pelo Ministério da Educação, a permissão para distribuir nas escolas materiais que promovem a inclusão e a não-discriminação de jovens homossexuais. A razão da recusa parece ser o facto desta campanha ser considerada ideológica.

Desde 1973 que a homossexualidade deixou de ser considerada uma patologia. Até lá, muitos homens e mulheres foram acusados de estar doentes e foi-lhes imposta uma terapia. Há trinta e cinco anos que, neste país, cabe ao Estado promover a igualdade e desde 2004 que não é permitido discriminar em função da orientação sexual. A carga ideológica da campanha radica pois no cumprimento dos preceitos constitucionais.

Ideológica é a promoção da heterossexualidade como única forma sadia de duas pessoas se amarem; ideológico é continuar a considerar a homossexualidade um desvio; ideológico é não reconhecer a natureza da discriminação.

À semelhança da Igreja do tempo de Bruno, parece que também o Ministério da Educação tem uma doutrina oficial sobre modos lícitos de amar. Aqui, ao que parece, a homossexualidade deve continuar a ser uma heresia e dizer que há muitas formas de amar uma blasfémia.

[Publicado também aqui]

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