a catástrofe de fukushima

Os defensores da energia nuclear argumentam que Chernobyl só foi possível porque a tecnologia e as normas de segurança soviéticas eram miseráveis. Estes argumentos levar-nos-iam a supor que nas democracias capitalistas o risco de desastre nuclear seria praticamente inexistente. É caso para perguntar: como é possível que o Japão, um dos países tecnologicamente mais avançados do mundo, esteja a braços com uma catástrofe nuclear? «As doses de radiação poderão ser potencialmente letais num curto espaço de tempo», diz Gregory Jaczko, presidente da Comissão Reguladora da Energia Nuclear norte-americana; a contaminação radioactiva espalha-se já por um raio de 80 quilómetros. A verdade é que nem a tecnologia mais avançada nem as mais rigorosas normas de segurança são capazes de garantir o risco zero. Os riscos podem ser minimizados, mas não podem ser totalmente eliminados.

Fukushima relançou a questão da energia nuclear, nomeadamente na Europa. Os governos europeus, de uma forma geral, têm tentado passar a ideia de que o desastre de Fukushima está circunscrito e não assume proporções dramáticas. O ministro francês da Indústria, Eric Besson, referiu-se a estes acontecimentos como «um acidente grave, mas não uma catátrofe nuclear»; o Secretário de Estado Chris Huhne disse que o que aconteceu no Japão não tem paralelo com a situação britânica, em virtude de aqui a actividade sísmica ser muito menor; o editorial de um jornal belga comparava o número de vítimas do tsunami com as da fuga radioactiva. Esta comparação é absurda não só porque o número de vítimas de um desastre nuclear se conta ao longo dos anos, mas também porque se compara um acidente natural, inevitável, com uma catástrofe perfeitamente evitável e de origem humana. Juntando a tudo isto as várias denúncias de falsificação de dados sísmicos (Sortir du Nucléaire), percebe-se facilmente que o objectivo deste discurso é evitar uma nova mobilização anti-nuclear.

Os argumentos do lobby nuclear são inaceitáveis e escondem o fundamental: a energia nuclear tem capacidade para destruir toda a humanidade.

Há dias conversava com um amigo meu, designer, que me falava de uma discussão em que tinha participado sobre que símbolos criar, para sinalizar cemitérios e depósitos de resíduos nucleares, de forma a garantir que estes fossem compreensíveis daqui a uns milhares de anos.

O debate em torno da opção nuclear é um debate eminentemente político, já que é de uma escolha de modelo de civilização que se trata. O grande desafio da humanidade, como diz Daniel Tanuro, é acabar simultaneamente com a energia nuclear e com o recurso a combustíveis fósseis. Ora, isto implica não apenas enormes investimentos em soluções eficientes, mas também a diminuição do consumo energético, principalmente nos países mais desenvolvidos.

Em última análise, este projecto reclama um outro compromisso económico, social e político, uma vez que, como diz o economista Paul Sweezy, «não havendo nenhuma maneira de aumentar a capacidade do ambiente de suportar os fardos (económico e demográfico) colocados sobre ele, resulta que o ajuste deve vir inteiramente do outro lado da equação. E uma vez que o desequilíbrio já atingiu proporções perigosas, também se segue que o essencial para o êxito é uma reversão, não simplesmente um abrandamento, das tendências subjacentes nestes poucos séculos passados».

2 comentários:

Anônimo disse...

A diminuição do consumo energético nos países avançados é uma miragem, ainda mais do que actualmente se tiverem de ser levados a cabo esforços de produção industrial no sentido de substituir as inúmeras centrais nucleares por energias renováveis. Faça uma conta simples: a produção anual de uma turbina eólica vs a produção anual de uma central nuclear. Depois, tenha em conta o tempo de vida útil da central nuclear (50 anos) vs os 15 de uma turbina eólica. É uma miragem pensar que podemos abdicar do nuclear na europa assim do pé para a mão. Seríamos engolidos pelos custos.

Anônimo disse...

Dado que a luta mais longa é a das mentalidades,
a força maior a do egoismo e o movimento perpétuo só da natureza, parece-me que já fomos longe demais.
A natureza fará como for natural.

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