Demoagogia contra a demagogia (fight fire with fire)

Já cá faltava. O povinho já há muito que a sabia toda. Falta dinheiro, reduza-se o número de deputados na AR. Até os jovens, sempre modernaços e p'rá frentex, na última edição do Parlamento dos Jovens, se insurgiram contra o número de deputados da AR depois de, na penúltima edição terem aprovado uma progressiva recomendação para obrigar os mandriões dos que recebem o RSI e dos que recebem subsídio de desemprego a "retribuir essas prestações à comunidade".

Agora, Mota Amaral, no encalço do mui brilhante e sempre atento Medina Carreira vem propor a redução do número de deputados na AR. A esperteza é epicamente saloia. Se a democracia custa muito dinheiro, temos bom remédio. Os custos que isso traz e que não são ignorados por Mota Amaral são secundários. 230 são muitos. Aliás, para fazer aquele trabalho, mais vale 10 muito bons, não é? Afinal, ser de Esquerda ou de Direita, do litoral ou do centro, do Sul ou do Norte, do continente ou das ilhas, pouco importa. Afinal vivemos ou não numa meritocracia?

E a próxima machadada, fica aqui prometido, é nas eleições. O dinheiro que se gasta naquela fantochada é astronómico. E que tal se for só de 10 em 10 anos? E se elegêssemos uma pessoa que depois nomeava os outros todos? E se não elegêssemos essa pessoa? Podia ser, por exemplo, o gestor a sair com melhor média de uma qualquer universidade...

8 comentários:

Nuno Ramos de Almeida disse...

Bom post. Esta medida não visa poupar, serve apenas para dificultar a proporcionalidade e, consequentemente, facilitar as maiorias PS ou PSD. Foi por isso que o PSD a inscreveu na Constituição com o beneplácito do PS.
Caso seja aprovada o CDS, o BE, o PC elegerão no máximo cerca de 10 deputados, deixarão de ter condições de acompanhar comissões e fazer outro trabalho parlamentar. Depois virá a converseta, da ligação dos deputados com os eleitos e qualquer dia, aproveitando estarmos em legislatura de revisão constitucional, estaremos a rever o princípio da proporcionalidade a criar círculos uninominais e a fazer um parlamento só com bloco central. Aí podemos fazer de São Bento uma academia de tango.

Diogo Augusto disse...

E o mais inacreditável é que, se fizerem isto, estão a seguir os desejos de muitíssima gente. Alguma dessa gente até votou num dos 3 partidos das pontas. O contexto social para aplicar isto é ideal. Não só não merecerá contestação como ainda será uma medida aplaudida. Tiro-lhes o chapéu à argúcia.

Diogo Augusto disse...

O debate em volta deste tema tem sido desenvolvido no Facebook:

Pedro Gois
Não é demagogia pura. Acho até um exercício interessante poder pensar o efeito/contexto da representatividade com menos deputados. Aliás, já foram mais do que são hoje sem que a representatividade tenha diminuído.

Diogo Augusto
Pedro, não se pode ter o melhor de dois mundos. Ou o número de deputados é suficientemente grande para que estejam representados no hemiciclo partidos minoritários e zonas do país menos povoadas, ou se acaba com a representatividade de pequenos círculos eleitorais e de pequenos partidos ou, finalmente, se reduz o número de deputados recorrendo a uma qualquer artimanha para não acabar com os pequenos círculos eleitorais mas arrasando a representatividade (ainda mais).

Diogo Augusto disse...

Pedro Gois
Caro Diogo. Tal não é rigorosamente verdade. Há várias fórmulas possíveis. Por exemplo, pode-se reduzir a representatividade nos grandes círculos de Lisboa e Porto e manter nos círculos eleitorais menos povoados ou com menos votantes (é o caso concreto dos eleitos pela emigração). Pode-se garantir um número mínimo de eleitos por distrito. Pode-se encontrar um sistema misto com circulos regionais + circulo nacional... tantas possibilidades.

Diogo Augusto
Admito a minha ignor... Ver maisância nestas questões mas, a não ser que haja círculos sobre-representados nos quais se poderia (embora eu não concordasse com essa solução) mexer, não vejo como é que se pode diminuir deputados sem mexer na representatividade ou dos pequenos ou dos grandes círculos. Além do mais, continua a haver o problema da representatividade dos pequenos partidos e da sua capacidade de acompanhar os trabalhos na AR que ficaria reduzida mesmo com percentagens de votos substanciais. Aliás, esses partidos seriam os mais prejudicados pelo menos na 1ª e 3ª soluções que apresenta.

Diogo Augusto disse...

Pedro Gois
Sem querer abusar do FB do Hugo Dias. Parece-me que um círculo nacional reduz a possibilidade dos pequenos partidos serem prejudicados. Mas, claro, reduzindo-se o número total todos perdem mas estaremos de acordo que uma parte da "gordura" do parlamento poderia ser cortada, aumentando-se a qualidade parlamentar. Mas, ainda assim, seria uma medida simbólica face ao déficit total. Mas o simbólico é importante...


Diogo Augusto
O Hugo não se importa! Seria, de facto, melhor termos o debate no espaço do blog mas sempre vou adiantando que não poderia estar mais frontalmente contra essa ideia da "qualidade parlamentar". E chamo ainda a atenção para o facto de a fronteira entre "simbólico" e "demagógico" ser muito, muito ténue além de, neste caso, o que de simbólico se transmite não me agrada particularmente: a ideia de que há políticos a mais ou de que o número ideal de políticos pode depender da situação económica do país. É uma ideia que reflecte um movimento muito mais abrangente de submeter a política à economia que não consigo aceitar.

Diogo Augusto disse...

Pedro Gois
Mudamos para outro espaço se achar adequado. Mas de facto neste ponto estamos em desacordo. Não há políticos a mais nem a menos nem a representatividade pode ser medida quantitativamente mas apenas qualitativamente. è de qualidade parlamentar (e dos parlamentares) que falo. Conseguimos ambos arranjar uma lista de parlamentares em qq das legislaturas contemporâneas que pouco contribuíram para a vida e obra parlamentar. Concordo que número de parlamentares não deve depender da economia. Em caso algum. Mas não é esse o ponto. É se a representatividade diminui em função do número de deputados e nisso não me parece. Sem alterar o número de lugares disponíveis o BE ganhou espaço porque teve votos para tal e a democracia acontece com 500 eleitos ou só com 200.


Diogo Augusto
E qual teria sido o percurso do BE se, nas primeiras eleições legislativas em que foi a votos, tivesse tido a mesmíssima votação mas nenhuma representação?

Diogo Augusto disse...

Pedro Gois
É aí que entra o círculo nacional que lhe garantiria até mais cedo essa representatividade. Um exemplo: se 100 deputados estivessem num circulo nacional cada 1% de votos garantiria 1 deputado. Aliás esse argumento poderia ser usado ao contrario e defender que se aumentássemos o número de deputados mais pequenos partidos poderiam estar representados...

Diogo Augusto disse...

Caro Pedro,

Vou tentar sistematizar. São essencialmente dois os pontos em que discordo da sua posição:

1. Por um lado, não vejo como é que, matematicamente, seja possível reduzir o número de deputados, manter a proporcionalidade e manter a representatividade de pequenos círculos eleitorais e de pequenos partidos.

2. Insistir na redução do número de deputados neste contexto transmite precisamente a mensagem de que se está a fazê-lo por motivos de racionalidade económica. É nesse sentido que, claro, a democracia não deixa de o ser, mas partir do princípio de que há deputados a mais é perigoso. Levando esse argumento ao extremo, poderíamos admitir que todos os partidos tivessem o mesmo número de deputado (o que fosse considerado ideal para desempenhar as tarefas parlamentares) e depois o voto de cada um teria um peso proporcional à votação no seu partido. Ora, essa lógica subverteria, a meu ver, a lógica da nossa democracia imprimindo-lhe uma lógica económica e não uma lógica política. A lógica política dir-nos-á que devemos estabelecer uma votação mínima para que haja representatividade na AR, e essa representatividade deve ser determinada a partir daquilo que consideramos ser politicamente legítimo e não economicamente racional.

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