
Pensar global e agir localíssimo

Colecção Moda Manif 2009/2010

Uma das dicas é não usar "verde tropa". Não sei se o/as manifestantes na Cimeira de Copenhaga acatarão esta sugestão. Irão de verde, mas talvez mais clarinho.
Um pedaço de paz, 36 anos depois

Dias antes, o assalto ao Palácio La Moneda havia terminado com o governo socialista de Salvador Allende. Sabendo da notícia, Victor Jara dirigira-se à Universidade Técnica do Chile, na qual trabalhava. Após uma madrugada de confrontos, os militares invadem as instalações universitárias e prendem os manifestantes, encaminhando-os depois para o Estádio. Reconhecido por um oficial, Jara é violentamente espancado a seu mando. Depois de algumas horas de tortura, e com as mãos amarradas a arame farpado, é atirado para um canto do Estádio, onde permanecerá - ferido, sem água e sem comida - até à tarde do dia seguinte. Acabará por ser arrastado para o centro do recinto, ordenando o oficial que lhe tragam uma guitarra. Enquanto era instado a cantar, soldados golpeiaram-lhe as mãos até se tornarem irreconhecíveis. Foi a última vez que foi visto com vida. Três dias depois o seu corpo foi encontrado junto a um cemitério.
Em 2006, um dos oficiais envolvido no sádico assassinato de Victor Jara - conhecido como "El Principe" - já havia sido "funado" pelo movimento que se dedica a lutar contra a impunidade no Chile de hoje.* Há alguns meses atrás, em Maio de 2009, começara finalmente a investigação sobre os assassinos do cantor, e que prossegue sem grandes resultados. Soube-se agora que no próximo dia 5 de Dezembro, 36 anos depois da tragédia, os familiares e o Chile irão fazer a Victor Jara o funeral que faltava.
*Aqui, em três partes, o documentário sobre "La Funa de Victor Jara" [1 - 2 - 3]
Quem me dera ser marxista
A intimidade entre o poder político e o poder económico não espanta ninguém. Uma das fontes mais relevantes de financiamento dos media reside nos pacotes publicitários que recebem de grandes grupos económicos (e de um outro a quem não basta o Diário da República - o Estado). Se as orientações editoriais induzem prejuízo político, os operadores económicos correlativos actuam em conformidade. Limpinho. Quem não se sente não é filho de boa gente. Depois há Regulação e Ministério Público. Mas isso é academismo.
P.S.: Pela notícia até parece que o Saraiva ainda existe e que a ERC «averigua».
P.S.2: O Lomba foi de vela.
P.S.: Pela notícia até parece que o Saraiva ainda existe e que a ERC «averigua».
P.S.2: O Lomba foi de vela.
Cartaz boomerang

Dependerá de Paulo Portas a decisão de acabar, ou não, com o negócio da Mota-Engil em Alcântara. Todos os partidos da oposição já disseram que o querem anular. O CDS pondera: "Temos de ser minimamente responsáveis"
(DN, 24/11/2009, um ano depois do lançamento deste cartaz)
Hossein Derakhshan

[entretanto, esta é uma boa ocasião para divulgar o Committee to Protect Bloggers, um colectivo digital dedicado a denunciar os ataques à liberdade de expressão]
Nem a propósito
O Público noticia que o "Papa renova amizade com o mundo da arte". Segundo a mesma fonte, "Tolentino Mendonça, também director do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, da Igreja Católica, disse que a iniciativa do Papa deverá ter consequências em Portugal: 'É uma oportunidade de sensibilização muito grande à Igreja para o lugar que a beleza ocupa e para transportar um clima de maior exigência. Em Portugal também é necessário o relançamento do diálogo'". Ora.
Afirma Pereira

Recordo aqui, a propósito, uma interessante distinção assinalada por António José Saraiva, há muitos anos, num artigo de jornal sobre a tradução portuguesa do francês «engagement». Propunha ele uma dupla tradução, correspondente ao duplo sentido da palavra original: por um lado, alistamento, por outro, empenhamento. Alistamento corresponderia ao «engagement» numa tropa, numa organização, num partido. Pressupõe uma adesão a regras pré-estabelecidas, uma atitude dominantemente passiva, «irresponsável». Ao contrário, o empenhamento é uma auto-mobilização de natureza emotivo-intelectual, uma atitude activa em que assumimos perante nós e perante os outros uma total responsabilidade, o risco de não termos quem nos «cubra» em juízos, afirmações, decisões, actos em que nos jogamos por inteiro.
Somos Estudantes, não somos Clientes!

Passei muito tempo naquela faculdade, muito pouco do qual em sala de aula. Fiz parte de duas listas vencedoras para a AEFLUP, mas também de duas derrotadas; pelo caminho passei pelo Jornal e Assembleia de Representantes da Faculdade, pelo Senado e Assembleia de Universidade do Porto. Mas os debates e activismos não eram apenas sobre política educativa. Das melhores memórias que tenho é o facto das reuniões inaugurais do primeiro grupo LGBT Universitário do Porto (Nós - Movimento para a Liberdade Sexual) terem sido nas salas da AE; ou o facto de no próprio dia da Invasão do Iraque (20 de Março de 2003) termos conseguido juntar 300 estudantes à porta da Faculdade para uma concentração de protesto.
O meu último acto de movimento estudantil foi a invasão “simbólica” do Senado da UP em finais de 2003. Digo simbólica, não por recear as conotações fortes associadas ao termo, mas porque a decisão de fixação do valor das propinas era um facto consumado e o nosso protesto não teria consequências efectivas. Mas não podiamos aceitar simplesmente que a decisão tivesse sido tomada nas nossas costas. A sua fixação foi concertada na Secção Académica do Senado, único orgão onde não havia representação dos estudantes. A autonomia das unidades orgânicas da UP impunha que fossem os Conselhos Directivos a tomar essa decisões. Estas reuniões realizaram-se convenientemente durante o mês de Agosto para garantir uma fraca participação estudantil. Se não fosse por esta “esperteza saloia” talvez a história tivesse sido diferente. Mas não foi. Não tenho boas memórias do ex-Reitor Novais Barbosa, nem do seu antecessor Alberto Amaral.
O artigo da Sandra Monteiro (recomendado pelo Miguel Cardina) condensa bem as alternativas em presença que justificaram as movimentações estudantis ao longo das ultimas duas décadas. E subscrevo o argumento de que perdemos a luta, mas que foi por causa dela que a implementação da Universidade S.A. demorou muito mais tempo do que seria expectável.
Retomando o fio à meada. Eis-nos chegados ao ano de 2009. Passaram mais de quatro anos desde a última manifestação nacional, que ficou conhecida pelas piores razões. Entretanto, de lá para cá, assistimos à aplicação de Bolonha e do RJIES, mas sobretudo a uma alteração paradigmática – de Acção Social Escolar para Empréstimos Bancários, de Gestão Democrática para uma outra “Profissionalizada”, do ensino tendencialmente gratuito para o eminentemente proibitivo. Três corolários: re-elitização da população estudantil (aqui, via 5 dias, embora fosse necessário um estudo mais aprofundado sobre esses efeitos); aumento da investigação cientifica mas "descartável"; fragilização dos meios das Universidades enquanto instituições de serviço público (subfinanciamento crónico que as empurra para o modelo de Fundações, sobrecarga e precarização do próprio corpo docente).
Mas para além destas consequências estruturais subsiste um outro problema – o da memória. Uma das grandes lacunas do movimento estudantil foi sempre o da memória histórica de lutas passadas. Embora exista uma continuidade das AAEE, o mesmo não se pode dizer da história concreta do movimento estudantil, das pessoas que dele participaram e das acções por ele realizado. Em 1997 sabia-se pouco sobre a guerra das propinas de 1992-94. O mesmo acontecia em 2002 sobre 1997. Quem se mantinha ainda ligado à Universidade procurava de alguma forma transmitir essa memória, mas é claro, de forma sempre limitada. Em quatro anos, várias novas gerações entraram na Universidade sem terem sido confrontadas uma única vez com discussões sobre o estado do ensino superior, ou das (não) razões para a participação numa manifestação.
Por isso acho que estes 4000 são boas noticias. É precipitado dizer que se trata de um ressurgimento do movimento estudantil, num momento em que ele seria tão importante. Para isso seria necessário muito mais do que o regresso (tímido) a expressões públicas de protesto (isso valeria um outro post mais extenso do que este). Mas a interpelação fica.
o estado de desgraça de gago ou a face oculta das universidades
(Reportagem esquerda.net na marcha pelo ensino superior)
TPC
Numa altura em que se espera uma nova vaga de lutas estudantis, vale a pena ler o interessante texto de Sandra Monteiro publicado no último Le Monde Diplomatique (e já agora façam como eu e aproveitem a campanha de Natal...). Fica um excerto:
Hoje, quase todos os estabelecimentos públicos, confrontados com um crónico subfinanciamento estatal que põe em causa o normal funcionamento das instituições, aplicam a propina máxima (972,14 euros), uma das mais altas da União Europeia (só dois países praticam valores mais elevados e sete não cobram qualquer montante). O modelo de financiamento com propinas, além de não ter contribuído para melhorar a qualidade do ensino, promoveu o recurso ao crédito bancário por parte de muitos estudantes que, não podendo agora cumprir com os pagamentos, são forçados a desistir do ensino superior.É só seguir o link para ler o resto.
Perderam-se uns tostões...

Não cumpriram os objectivos, mas também não foi um erro a sua implementação. Que objectivos não cumpriu? Não conseguiu dissuadir aquelas pessoas, manhosas, que procuravam se submeter a cirurgias por auto-recreação, ou então de propósito para aumentar as filas de espera, ou esta medida era simplesmente uma tontice, com a agravante de ser absolutamente injusta?
“Face Oculta? Não ligo nada a isso, ainda é pior que novelas”
Considero que os casos complexos – Moderna, Casa Pia, Freeport, Face Oculta, etc. - devem ter, desde o seu início, um tratamento especial, por diversas razões: por, não raras vezes, terem contornos que escapam à formação técnica dos investigadores; por terem um impacto e visibilidade mediáticas muito significativas; e por envolverem indivíduos ou organizações com muito poder social e político. Acima de tudo, estes casos, e pegando em algo que o Boaventura de Sousa Santos escreveu em 2004, “têm poder suficiente para virar o público contra o sistema judicial e para criar divisões profundas no seio deste” (não é a isto que assistimos actualmente?). Esta visão pode ser simplista, já que não apetrechada de jargão jurídico ou técnico. Mas, na verdade, é de forma simplista, mas atenta, que o/a cidadão/ã comum segue estes casos, construindo, também a partir deles, fortes opiniões sobre a administração da justiça em Portugal. O Centro de Estudos Sociais realizou, em 1993 e 2001, uma sondagem sobre a administração da justiça e o funcionamento dos tribunais a uma amostra representativa da população portuguesa. Ora, os resultados desse inquérito mostram que a maioria dos inquiridos duvida da capacidade dos tribunais para fazer justiça (quer em condenar as pessoas que efectivamente são culpadas, quer em condenar os crimes cometidos por pessoas com poder ou com dinheiro), e entende que "com dinheiro e um bom advogado uma pessoa consegue o que quer do tribunal." Nas afirmações referentes ao desempenho do sistema, os inquiridos, uma vez mais, consideram que os "ricos" são tratados de forma privilegiada nos tribunais comparativamente com os "pobres" (75,3% em 1993 e 71,6% em 2001). As consequências da condução e resolução (ou não resolução por prescrição) destes casos são políticas. Mas não esqueçamos que têm igualmente resultados directos nas expectativas das pessoas relativamente à justiça.
Quando eu falo em “pessoas” não estou, no entanto, a incluir o Belmiro de Azevedo, autor da frase que coloquei no título.
Quando eu falo em “pessoas” não estou, no entanto, a incluir o Belmiro de Azevedo, autor da frase que coloquei no título.
Freud explica

Um debate conveniente

sinal de fumo

Importam-se que não fale disso?
Comunistas, pseudocomunistas, criptocomunistas e filocomunistas discutem dos seus assuntos e repartem-se em quatro zonas. Entretidos é que eles estão bem. É deixá-los. Bem vistas as coisas - e é desta que perco de vez a credibilidade - talvez Isaiah Berlin não esteja assim tão longe da razão quando radica a distopia na vontade geral rousseauniana. Daí à classe é um tiro (!) e depois sabe Deus e quem passou por elas. Mas o que verdadeiramente me intriga no contencioso é não ter visto, salvo erro, a bujarda típica do clube de fãs do Fairclough atirada à cara do adversário - e esta, como manda a sapatilha, serve para qualquer um, e em circunstâncias variegadas:
- Quando uso uma palavra* - disse Humpty Dumpty, num tom desdenhoso -, ela significa exactamente o que eu quero que ela signifique, nem mais, nem menos.
- A questão está em saber - disse Alice - se tu podes fazer com que as palavras tenham significados diferentes.
- A questão está em saber - disse Humpty Dumpty - quem é que manda.
*Como aquelas começadas em «comum», que redundam em «comunismo», que não primam pela atractividade ideológica nem suscitam grande paz de espírito.
- A questão está em saber - disse Alice - se tu podes fazer com que as palavras tenham significados diferentes.
- A questão está em saber - disse Humpty Dumpty - quem é que manda.
*Como aquelas começadas em «comum», que redundam em «comunismo», que não primam pela atractividade ideológica nem suscitam grande paz de espírito.
Vinte anos depois do muro

Porque faz hoje 20 anos que começou a ser derrubado o muro de Berlim, remeto para um texto que escrevi recentemente para o blogue Caminhos da Memória, republicado no último número da revista Vírus. Aqui fica o primeiro parágrafo com a respectiva ligação:
Em Novembro de 1989, após um êxodo intenso de alemães de leste para oeste e um conjunto crescente de manifestações populares, começou a ser derrubado o muro que dividia a Alemanha em duas. A queda do muro simbolizou a derrota histórica do socialismo soviético, mas a transição não foi simples e indolor. Basta ver Good bye Lenin, de Wolfgang Becker, para se perceber como a voragem da mudança levou a modos impressionantes de recusa e desnorte, que o filme ilustra magnificamente no episódio do telejornal forjado. Pese embora todo o esforço da reunificação, a antiga cortina mantém-se ainda hoje esvoaçante, ora na taxa de desemprego duas vezes maior no leste, ora nas diferenças culturais que persistem mesmo entre os mais jovens, ora em pormenores deliciosos como os distintos semáforos em Berlim – uns bonecos com chapéu ou sem chapéu –, que evocam nessa diferença a perturbante memória recente da cidade. [Ler mais]
Em Novembro de 1989, após um êxodo intenso de alemães de leste para oeste e um conjunto crescente de manifestações populares, começou a ser derrubado o muro que dividia a Alemanha em duas. A queda do muro simbolizou a derrota histórica do socialismo soviético, mas a transição não foi simples e indolor. Basta ver Good bye Lenin, de Wolfgang Becker, para se perceber como a voragem da mudança levou a modos impressionantes de recusa e desnorte, que o filme ilustra magnificamente no episódio do telejornal forjado. Pese embora todo o esforço da reunificação, a antiga cortina mantém-se ainda hoje esvoaçante, ora na taxa de desemprego duas vezes maior no leste, ora nas diferenças culturais que persistem mesmo entre os mais jovens, ora em pormenores deliciosos como os distintos semáforos em Berlim – uns bonecos com chapéu ou sem chapéu –, que evocam nessa diferença a perturbante memória recente da cidade. [Ler mais]
Aos outros o que dispenso

Ponto prévio: não me interessa por agora a querela sobre referendar ou não o assunto, vinda de sectores que curiosamente acham o tema secundário. Também não me proponho alinhar os raciocínios em torno da distinção entre casamento civil e casamento religioso. Menos ainda me importa desmontar a equação “casamento igual a procriação”, que exclui do contrato não só os gays mas também os inférteis, os menopáusicos e os abstémios. Sei como estes argumentos serão centrais nos tempos que se avizinham, e não penso dispensá-los. O mesmo se diga do velho e torto debate acerca da origem – biológica ou cultural – da homossexualidade, que não tem aparecido muito por agora mas que aflorará certamente quando (e se) chegarmos ao tema da adopção.
Para que não se arruíne a economia necessária a um post, entro de imediato no exercício enunciado, começando pelo que chamarei de "argumento liberal" na defesa do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Reza mais ou menos assim: é possível exigir para os outros aquilo que eu não quero para mim. Pelo simples facto de que eu tenho essa opção de poder ou não casar – ou seja, de ver reconhecido pelo estado a união livre que tenho com outra pessoa e enquadrar-me no complexo de direitos e deveres que a regula – e outro/as, não a tendo, não podem efectivamente escolher. Não há liberdade sem possibilidade de escolha.
Por outro lado, a defesa do casamento entre pessoas do mesmo sexo tem também um valor político que transcende essa reivindicação específica. E aqui entra o que, à falta de melhor, se poderia chamar de "argumento democrático". É mais ou menos assim: a afirmação legal do casamento gay ajudará a trazer para o campo do visível um espaço ainda tecido por opacidades, medos e estigmas, doloroso porque alojado no íntimo de cada um e cada uma. Como se sabe, a partir do momento em que o tema foi colocado nas agendas legislativas, os discursos sobre as homossexualidades estabeleceram-se no espaço público e mediático com efeitos francamente positivos, apesar da persistência de fortes bolsas de homofobia (basta pensar no assassinato de Gisberta ou no recente caso do sangue).
Claro que é possível perguntar: mas não se pode ser contra a descriminação das lésbicas e dos homossexuais sem exigir o casamento gay? Pode, mas é aí que reentra o "argumento liberal": fica a faltar alguma coisa a partir do momento em que existam homossexuais que queiram casar e usufruir de direitos e deveres que lhes são vedados em situação de união de facto. A solução vrrnhiec também não resolve: para além de parecer um último reduto de quem já não tem razões a propor, fica a faltar algo quando existem homossexuais que - sublinhe-se - querem "casar". Um enorme pormenor.
Deixo para o fim o "argumento radical" (ou "pós-radical"). Não é bem um argumento mas é mais um modo de ver as coisas. Sei que a família foi (ainda o é, tantas vezes) um espaço de opressão da mulher e abano afirmativamente a cabeça a algumas desmontagens ideológicas da instituição e dos seus modos de formalização. Mas lutar pelo direito ao casamento gay não significa abdicar do estímulo crítico em torno de noções como família, género, reprodução ou casamento. Penso mesmo que a sua aprovação é condição para a ampliação destes debates, para além de contribuir para uma maior disponibilidade social e cultural para aceitar a diferença tout court. Já é qualquer coisinha.
A facção da CGTP

A participação na Confederação Europeia dos Sindicatos parece ser pacífica, mas apesar de oficialmente a CGTP não ter nenhuma filiação numa organização sindical mundial, o assunto foi objecto de discussão no seu último Congresso. O motivo prende-se com a criação recente da Confederação Sindical Internacional, mas também pela participação de alguns dos seus dirigentes nas organizações de Sectores de Actividade (TUI´s) da Federação Sindical Mundial, associada historicamente ao socialismo real dos Países de Leste.
O argumento para não aderir à Confederação Sindical Internacional é de prudência, justificado pelo facto de muitas organizações sindicais nacionais estarem ainda de fora da CSI. Aceitemos, para já, essa "prudência" da Direcção da CGTP, mas também que alguns dos seus sindicatos queiram fazer esta discussão publicamente e sem fantasmas ideológicos.
A revolução não será twittada?

Nos dias 9 e 10 de Novembro, podemos acompanhar no twitter — em português e em "tempo real" — as últimas horas do Muro de Berlim. A iniciativa da emissora pública alemã 'Deutsche Welle' já está em aquecimento e promete aguentar o delay de 20 anos.
O que a direita realmente pensa do casamento entre pessoas do mesmo sexo
Não devem casar porque não podem constituir uma família. Melhor dizendo, eu não tenho nada contra pessoas homossexuais, até já me cruzei na rua com um gay que é vizinho do meu tio-avô paterno. Toda a gente sabe que é gay, e por isso nunca se casou. Não me oponho. Mas, num cenário de crise, em que o desemprego é tão premente, em que importa aumentar a produtividade, em que a gripe A mostra a fragilidade do sistema de saúde, não me parece urgente esta questão, imposta aliás por uma minoria. (Consta que o lobby gay é poderosíssimo. Até já conseguiram colocar um “deles” no parlamento). Ademais, se esse assunto avançar, então deve ser feito um referendo porque é uma questão social importante. Importante, mas não crucial neste momento. Mas significativa o suficiente para não ser votada em Assembleia da República. Tanto mais que actualmente, não havendo maioria absoluta, um texto legislativo uniforme seria quase impossível. Na anterior legislatura não podia ser, porque a maioria absoluta impedia os restantes partidos políticos de darem um verdadeiro contributo para a redacção legislativa. Só seria viável por referendo. Mas, parece-me negligente gastar recursos numa altura de crise na realização de um referendo numa questão tão menor. E se é para haver referendo, que se marquem logo dois, não vá acontecer como no aborto. Aborto… esse foi outro que veio destruir o valor da família. Como o casamento dos gays, que não podem constituir uma família e que, por isso, não devem casar.
Quando é que já assistimos a uma esquizofrenia semelhante? Ah, pois foi.
Quando é que já assistimos a uma esquizofrenia semelhante? Ah, pois foi.
E depois diz que a culpa é do mercado
Este texto já tem ano e meio (ok, o subtexto tem séculos), mas vale a pena repescá-lo nos tempos que correm pelo delicioso efeito boomerang no debate sobre o casamento de pessoas do mesmo sexo. À boleia do Zygmunt Bauman (graças a Deus, de tão bom ou tão mau, amamenta meio mundo), Alexandra Teté (!) lamenta e disserta sobre a fragilidade, a caducidade e a fluidez dos laços sociais contemporâneos, calamidade emergente com a mercadorização da vida (uh!). Assim conclui - à chica-esperta - que o direito à dissolução unilateral do casamento não passa de uma reivindicação epidérmica da «espuma dos afectos». Acentuando a anomia e fragmentação social, converte a segurança das relações conjugais num desumano cálculo de indemnizações. Bem sabemos que o divórcio sem culpa não está imune a críticas sociojurídicas e que a complexidade da problemática não se presta a juízos lapidares. Mas é engraçado assistir à sofisticação progressiva do argumentário desta fauninha e ao facto de bem - mas bem - lá no fundo não querer outra coisa se não ver a paneleiragem casada, com filhos adoptados e bem-criados. Constituir família, vá. Se a Teté vai ao Bauman, terá a esquerda de rebuscar a Rerum Novarum?
Boas e más notícias para Saramago
O nome de Saramago está incluído na long list do Prémio literário Impac Dublin. Já não é mau; Deus é amigo. Também consta dessa lista o José Rodrigues dos Santos. Deus, afinal, é mauzinho e tem um sentido irónico duvidoso. A má notícia para Saramago é, pois, que Deus castiga. A boa é que, afinal, ele tinha razão.
Chega de saudade
Entristece-me a incapacidade do PCP em questionar os fantasmas ainda persistentes desde a ruína do socialismo real. Digo-o com sinceridade: parafraseando o outro, acho o PCP indispensável à democracia. E também à construção de um campo que se situe à esquerda do PS que nos governa. Isso não significa que se tenham de esbater as diferenças, as divergências e os caminhos percorridos, como é óbvio. Mas exige algo mais do que nos agarrarmos ferreamente a um passado que se esfuma. Quando leio isto, imagino que na Soeiro Pereira Gomes ainda há quem acredite no noticiário forjado de Good Bye, Lenin.
Des mots qui vont très bien ensemble
O acesso à escola e o sucesso educativo podem ser pensados como que geracionalmente: novos problemas e novas maneiras de pensar velhos problemas. Se o primeiro é facilmente reivindicável à provisão pública via alargamento da escolarização, não é preciso grande domínio das teorias da reprodução social para concluir que o segundo é terreno congenitamente armadilhado (muito embora não morramos por falta de soluções mágicas pós-socialistas, do tipo «redistribuição + reconhecimento» e zás, matamos dois coelhos). Ora daí a exigir o direito ao sucesso vai um passinho perigoso, sobretudo porque dá corda desnecessária ao contra-ataque do costume. Se é gralha na exposição de motivos - porque não versa sobre isso o diploma -, faça-se a fineza de corrigir. Enfim, pieguices.
Commonwealth

Sou daqueles que considera que o argumento central do “Império” sobreviveu mal ao seu confronto com a realidade. A invasão do Iraque a 20 de Março de 2003 mostrou que o Império (ainda) tem um Centro, embora a batalha pela hegemonia mundial no século XXI ainda esteja largamente em aberto.
Afinal para compreender a dinâmica da Globalização Neoliberal ainda é necessário que nos socorramos da interacção entre a lógica territorial do poder (Estado-Nação) e a do capitalismo (Acumulação ilimitada) explicada por David Harvey; ou, como Boaventura de Sousa Santos propõe, das constelações de práticas inter-estatais, capitalistas globais, sociais e culturais transnacionais.
A imensa virtude destes dois primeiros livros foi o facto de ter gerado uma nova gramática política, de leitura estimulante e instigadora de intensos debates. Quanto ao terceiro, ainda não o li, mas chegará em breve às minhas mãos. Aparte da novidade na argumentação que “Commonwealth” poderá trazer, será um bom momento para revisitar a coerência global da obra de Negri e Hardt.
Dobrou um século e feneceu
Claude Lévi-Strauss - o «fundador da antropologia moderna», o «pai do estruturalismo», o homem que disse que odiava viajar e escrever Tristes Trópicos - morreu este fim-de-semana à beira de completar 101 anos. Vale a pena ler os (poucos, como lembra o Tiago) que sabiam que ele ainda estava vivo. Começando por este texto de Luís Quintais e continuando pelos depoimentos de Francisco Vaz da Silva, Filipe Verde, Hermínio Martins, Rui Bebiano e Osvaldo Manuel Silvestre, todos feitos por ocasião dos seus 100 anos. E depois ir ouvir a música que o Bruno aqui nos deixou.
Claude Lévi-Strauss (1908-2009)
Acredito que fossem poucas as pessoas que sabiam que Lévi-Strauss estava vivo. Para muito boa gente - nesse sentido - a sua morte foi uma surpresa.
Um post para o Zé da Messa

Não conheci o Zé da Messa, mas sabia que tinha ganho a alcunha da fábrica onde trabalhou desde os 14 anos na montagem de máquinas de escrever. Nos seus tempos de glória, a Messa chegou a empregar mais de 1700 pessoas. Em meados dos anos 80, a administração levou-a à falência, ficando a dever 500 mil contos aos trabalhadores. Ao fim de vinte anos de demora dos tribunais, os 500 mil contos de créditos (a preços de 1987) transformaram-se em menos de 520 mil... euros, (104 mil contos em 2005), a dividir pelos entretanto reformados e as famílias dos já falecidos.
Para conhecer melhor o Zé da Messa, e para que outros o conheçam também, ajudei a fazer este vídeo. A estreia foi na festa de homenagem que no sábado juntou 500 pessoas na Caixa Económica Operária ao som dos Peste & Sida, Ex-Votos, Dalailume, Albert Fish e do João Ribas a cantar hits dos Censurados com os Gazua e os Revolta. Uma vez mais se confirmou que o punk não morreu, e o Zé da Messa muito menos.
A sombra do gira-discos

Há muitas maneiras de se conhecer um país. A lista é vasta e maleável: vai da língua falada à organização política, dos mitos nacionais à geometria urbana, dos cheiros dos mercados à composição dos cemitérios. A leitura do último livro de Luís Sepúlveda fez-me pensar numa outra via de acesso: a sombra.
A sombra de um país (ou de uma pessoa) é sempre mais do que a projecção de um passado. A sombra do Chile de que fala Sepúlveda, por exemplo, tem a forma das esperanças revolucionárias do período Allende e das torturas da era Pinochet. Mas tem também a forma da inconsciência dos novos inspectores da polícia que pouco sabem de Villa Grimaldi e o desprezo das pessoas «comuns» pelas histórias daqueles que sofreram.
No livro de Luís Sepúlveda, A Sombra é também a alcunha de um misterioso indivíduo de linhagem familiar anarquista que sussurrava informações importantes à esquerda chilena nos anos sessenta e setenta. Envolvida nos dias de hoje na preparação de um acto revolucionário, A Sombra é fatalmente atingida por um gira-discos arremessado de uma janela no calor de uma discussão doméstica. Confere: a sombra de um país (ou de uma pessoa) é essa estranha presença que volta e meia é atingida por um passado que se julgava obsoleto. E que regressa sempre sob uma outra forma.
Como era aquela coisa da tragédia e da comédia?
A crise e as lantejoulas
Há duas abordagens possíveis para isto. Uma não traz novidade ao debate recente sobre a epistemologia da crise: a alimentação clientelar de instituições bancárias, a intimidade material e simbólica entre elites políticas e económicas, o embuste da eficiência administrativa e gerencial do sector privado (método: tribal e «à-vontadinha»), ou ainda a raiz gambozina da regulação e supervisão financeira. Em suma: a ilustração empírica do Estado capturado e do «liberalismo real». Outra, mais preocupante, é acima de tudo estética e reside na tensão entre cabaz (coisa de IPSS) e baú (imaginem a elegância). Com franqueza: ninguém oferece salvas de prata no Natal. É piroso. É pindérico. No máximo, um faqueiro: para o que der e vier.
O estranho caso Vilarigues

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