Tugas

(Desabafo escrito em Luanda, via New York Times)

São longas as filas de espera nos consulados de Angola em Portugal. Quem lá está raramente é quem para cá vem. Quem de lá vem raramente cá chega. No próximo domingo é a vez do Cavaco. Só no ano passado vieram para Angola trabalhar mais de 23.000 tugas.

Enquanto Portugal não sai da moody de baixo, Angola cresce. Angola constrói. Angola mexe. Angola é (de novo) a terra prometida. E se vista da baía de Luanda já não é tão tranquila quanto em tempos terá sido, as lagostas continuam a sair frescas. Embora o trânsito seja infernal, as ruas um perigo e a vida assustadoramente cara, vale a pena o esforço. Vale a pena encher a mala de repelente e partir à aventura. Viver loucamente nos trópicos. Comer bitoques e beber super-bocks servidas por um preto. Ainda que para isso nos tenhamos que sujeitar à sua vil ignorância. À sua natural indolência.

O problema não está neste pedaço de nada ao qual um dia chamámos Angola. O problema, murmuramos agora entre dentes, são mesmo os pretos. Os empregados demoram a servir. Os funcionários públicos não sabem o que fazem. Os operários são uns incompetentes. Os parceiros económicos que nos são impostos uns irresponsáveis.

Mais de 30 anos depois, a Rainha Ginga continua a não gostar de trabalhar. Vazia de significado, a sua existência é tão supérflua quanto antes. O único perigo é que ela agora tem uma catana na mão. E nós já não temos o Salazar. O Paulo Dias de Novais já foi cortado aos pedaços. Pode ser que um dia o Dom Afonso Henriques fique sem pila.

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