E Maria Cavaco Silva?

As reedições sucessivas do debate sobre o movimento feminista - história, gerações, agenda e false-friends - nem sempre são capazes de reencontrar os seus outputs mais originais, sobretudo quando residem nas zonas mais insupeitas e comichosas da cultura política contemporânea. Fica um contributo - indirecto e ardiloso, como manda a sapatilha - de José Pacheco Pereira que, paradoxalmente, nos tem presenteado nos últimos tempos com provocações dignas de um José Vilhena. De resto, proporcionais ao facilitismo e à injustiça intelectual com que tem vindo a ser criticado e menorizado em diferentes mesas de café:

Um ano depois [das suas declarações infelizes sobre o Maio de 68], o mesmo Sarkozy casou com uma senhora que foi modelo, que no exercício da sua carreira apareceu várias vezes em trajes menores e mesmo sem trajes nenhuns e que, sem Maio de 1968, muito dificilmente poderia ser primeira-dama de França, nem a ninguém passaria pela cabeça que fosse, a começar pelo putativo esposo. Na tradição de Mitterrand e Chirac seria quando muito uma espécie de "segredo de Estado" permitido e consentido por velhas regras machistas e pela douce France, num universo paralelo ou em Tóquio, mas não no Eliseu. Goste-se ou não - e eu não gosto da exposição excessiva da privacidade, mas gosto que Sarkozy possa escolher ter a vida que quiser -, os costumes mudaram. As sociedades têm face à vida pessoal uma atitude mais laica e menos normativa, a hipocrisia continuou mas desabitou alguns lugares e isso é do "espírito do tempo". O problema de Maio de 68 é que o mês "a liquidar" está bem dentro da cabeça dele e ele não sabe, ou faz que não sabe.


in “Revisitações aos locais infectos”. Público. 6 de Abril de 2008.

3 comentários:

Miguel Cardina disse...

Tiago,
Gostei do output original de associares a Carla Bruni à Maria Cavaco.

Tiago Ribeiro disse...

Pelo contrário: dissociei :)

leopoldina disse...

Olá,
entre a sapatilha e o Zeitgeist...

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