Privatização dos CTT: Teremos sindicatos à la française?

Sobre a possível (provável?) privatização dos CTT, ao percorrer as notícias francesas lembrei-me do processo muito conturbado que o caminho para a privatização dos correios franceses (La Poste) originou. Foi, julgo, em meados de Outubro de 2008 que o Governo de Sarkosy começou a falar nessa possibilidade.
A partir daí, sindicatos, partidos de esquerda, uns mais que outros :) , outras organizações e cidadãos/ãs - num processo liderado por sindicatos , PCF e o NPA - Novo Partido Anticapitalista (o Partido Socialista Francês também esteve, mas muito menos) conseguiram, mediante uma "cerrada" e ampla contestação organizada, lançar um debate público nacional que marcou a agenda pública e política durante vários meses e protelou a mudança de estatuto da Poste durante quase ano e meio.
Contudo, há poucos dias (27 de Fevereiro), foi publicado um decreto-lei que transforma a Poste numa sociedade anónima com capitais públicos, o que não é, diga-se (não sou nenhuma especialista mas enfim...), a mesma coisa que uma privatização. Aliás o tal decreto-lei define que:
"cette transformation ne peut avoir pour conséquence de remettre en cause le caractère de service public national de La Poste (...) L'Etat gardera une part majoritaire et autorise l'actionnariat salarié. (...) Le nouveau statut de La Poste ne change rien à ses missions, dont la distribution du courrier sur tout le territoire. Ses salariés actuellement fonctionnaires gardent leur statut et elle maintient ses dix-sept mille points de contact en France."

Se isto pode, de facto, aparecer como um primeiro passo firme rumo à privatização (até porque tinham dito o mesmo em relação à France Telecom e ao Gaz de France em 2004 - entretanto privatizadas - e que a sua entrada no mercado concorrencial europeu far-se-á em Janeiro 2011), não é ainda assim menos certo que ficou bastante aquém - e que foi bem mais moroso e menos "pacífico" - do que Sarkosy e a sua ministra da economia (se bem que com Sarkosy os/as ministros/as não mandam nada ou quase, mas isso é outro pormenor) tinham inicialmente em mente. A isto não foi alheia, claro, toda a contestação que este tema gerou por parte da sociedade civil e da oposição. Vale aliás a pena referir que mais de 60 sindicatos, associações e partidos de esquerda uniram-se num "comité nacional contra a privatização da Poste" (ver aqui) com a criação de comités regionais pelo país, inúmeras iniciativas descentralizadas, manifestações e a realização de uma Consulta Nacional em Outubro 2009 (sem valor jurídico, a que chamaram "consulta cidadã") realizada em 18 000 locais de voto improvisados (câmaras, mercados, estações de comboio, etc.) e na qual à pergunta O governo quer mudar o estatuto da Poste para a privatizar: concorda? 98% dos cerca de 2 milhões e 300 mil votantes responderam Não.
Aconselho aliás a verem este pequeno vídeo da União Sindical Solidaires com uma das campanhas lançadas na internet e nas televisões, excertos de manifestações e alguns dos principais argumentos para a contestação (deve ser um serviço público assegurado pelo Estado e por isso para todos/as; vão fechar serviços e prejudicar populações nomeadamente as vivendo em meios mais rurais/interiores; põe em causa a coesão territorial; acentua desigualdades; vai prejudicar os/as seus/suas trabalhadores/as). Por azelhice minha por certo não consigo aqui carregar o vídeo mas fica o link http://www.dailymotion.com/video/xa7nws_solidaires-contre-la-privatisation_news.
Ao relembrar-me de todo este processo dei por mim a pensar na "realidade" portuguesa e fiquei "curiosa" para ver qual a reacção e acção quer dos sindicatos, dos partidos de oposição (refiro-me aos de esquerda, claro) e da sociedade civil caso o governo avance com esta "ideia" de privatização dos CTT. Vamos ter unidade sindical? BE e PCP a juntar-se a sindicatos e associações numa plataforma nacional? Vamos ter a nossa consulta cidadã? Euuhh... não me parece, pois. Mas ainda assim Affaire à suivre!

2 comentários:

Anônimo disse...

Na sua análise relativamente ao contexto da sociedade Francesa esteve optima dá para perceber que está integrada. Que estuda? Sociologia? O problema Portugues é outro e pelos vistos n está bem informada das nossas politicas.

magda alves disse...

Caro anônimo. Formada em sociologia, exactamente, acertou! É um bom começo:) então e qual o problema português que eu não percebi?

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